Luana Marques, psicóloga e palestrante da Star Palestras, é a primeira mulher latina e a pessoa mais jovem a presidir a Associação Americana de Ansiedade e Depressão.
Nesta entrevista exclusiva que ela deu ao Valor Econômico, Luana fala sobre seu livro mais recente “Viver com ousadia”, lançado em 2023 pela editora Sextante.
A autora defende que olhamos para o lugar errado quando os elegemos vilões da saúde mental. A causa é outra: a evitação psicológica. Na entrevista a seguir, Marques explica esse conceito e o método criado por ela para treinar três habilidades que, ao reprogramarem o cérebro, permitem romper com a paralisia: “modificar”, “abordar” e “alinhar”.
Entrevista com Luana Marques
A base vem da terapia cognitivo-comportamental (TCC). Mas há outra inspiração: dona Maria Helena, a mulher que escolheu como avó, cuja sabedoria anos depois Marques viu ter embasamento na neurociência. O livro, publicado originalmente nos Estados Unidos com o título “Bold Move”, mescla ensinamentos da avó a dados científicos, casos de pacientes e e passagens autobiográficas para mostrar como as habilidades ensinadas atuam na prática.
Nascida na cidade mineira de Governador Valadares, Marques teve uma infância marcada por pobreza, vício em álcool e drogas do pai, violência doméstica contra a mãe. Foi aos 15 anos, sob a influência de dona Maria Helena, mãe de seu então padrasto, que a autora começou a vislumbrar a ousadia de sonhar alto.
Hoje, aos 46 anos, radicada em Boston, nos Estados Unidos, é professora associada de psicologia da Faculdade de Medicina de Harvard e diretora de um laboratório de pesquisa em saúde mental no Hospital Geral de Massachusetts. Foi a primeira mulher latina e a pessoa mais jovem a presidir a Associação Americana de Ansiedade e Depressão. Nessa trajetória, construiu as ferramentas que agora compartilha.
O que é evitação psicológica e por que ela é o verdadeiro inimigo da nossa saúde mental, e não as manifestações de desconforto como ansiedade e estresse?
Luana Marques: Quando a pessoa está ansiosa ou desconfortável de alguma forma, ela tenta se sentir melhor rapidamente. Em inglês, chamamos de “quick fix”. Como beber um vinho depois de um dia estressante. Ou então você recebe um e-mail do seu chefe, e isso te deixa ansioso. Algumas pessoas reagem respondendo imediatamente. Outras recuam, nem leem o e-mail. E outras permanecem congeladas diante da tela. São soluções rápidas que livram logo do desconforto, mas no longo prazo te deixam empacado. É como se você tomasse remédio para febre. Baixa a temperatura, mas não cura a infecção.
Quando o ato de tomar uma taça de vinho é uma forma de evitação psicológica e quando é apenas o prazer de uma boa taça de vinho?
Marques: A evitação psicológica não é o que você faz, e sim o motivo por trás do que você faz. A função do seu comportamento é que é o problema. Ir à academia é ótimo, mas se a pessoa se exercita durante muitas horas do dia para evitar a ansiedade porque ela tem anorexia, isso é um problema. Eu lido com as minhas emoções comendo biscoitos, e isso causou uma vida inteira brigando com a obesidade. O meu marido adora biscoitos, mas para ele é só um biscoito. A função é outra.
De que maneira o cérebro atua tanto para nos prender nesses comportamentos quanto para ser uma arma contra a evitação psicológica?
Marques: O cérebro foi feito para fazer duas coisas: nos proteger e prever o futuro. A amígdala é a parte do cérebro desenvolvida para nos proteger, e ela é ativada diante de qualquer percepção de ameaça, seja uma ameaça real como um leão, seja um desconforto como a ansiedade. Isso é imediato. Quando isso acontece, o córtex pré-frontal para você ter controle do seu cérebro. Porque a gente esqueceu que o cérebro é um órgão e que se ele for exercitado corretamente, ele muda. Nós não vamos parar de ter pensamentos negativos, isso não existe na vida. Mas quando esses pensamentos acontecem, é possível pausar e exercitar o cérebro.
De que forma as habilidades de “modificar”, “abordar” e “alinhar” são um antídoto à evitação psicológica?
Marques: Se você está com muita ansiedade e falando para si mesmo “Eu não sou suficiente”, “Eu não consigo fazer isso”, “modificar” é a habilidade de pausar, identificar seus pensamentos e se perguntar: o que eu falaria para o meu melhor amigo nessa situação? Porque quando a gente pensa na terceira pessoa, ativamos o córtex pré-frontal em vez de de deixar a amígdala e as emoções assumirem a direção da nossa vida. Portanto, “modificar” é uma habilidade para você pausar e mudar seu pensamento. A consequência disso é que você acalma o cérebro.
E as outras duas habilidades?
Marques: O desconforto sempre mandará você evitar. Um exemplo: você está com medo de pedir aumento de salário. Você não vai pedir, porque você vai se convencer de que não está em condições de fazer isso. “Abordar” é dar um passo em direção ao desconforto para treinar o cérebro. Ou seja, você faz a ação oposta ao que as emoções dizem para fazer. Já “alinhar” se refere ao fato de que o estresse acontece quando as nossas ações do dia a dia não estão alinhadas com os nossos valores pessoais, aquilo que mais importa na nossa vida. Se você valoriza a criatividade, mas no seu trabalho você faz a mesma coisa todo dia, você começa a se sentir estressado. Todo domingo eu passo 15 minutos olhando minha minha agenda e me perguntando: como os meus três valores, impacto, família e saúde física, estão refletidos na minha semana? Onde está o exercício físico? Quais reuniões vão me permitir gerar impacto? Isso acalma o cérebro.
Os exercícios propostos no livro para treinar essas habilidades passam pela escrita. Por que colocar nossos pensamentos e emoções no papel é uma ferramenta tão poderosa?
Marques: Dados científicos mostram que, quando você escreve, você ativa o córtex pré-frontal. E toda a ideia de trabalhar o cérebro é diminuir a reação da amígdala e aumentar a reação do córtex pré-frontal. Sem escrever você não consegue fazer isso, porque o cérebro é muito acelerado. Quando você presta atenção no que está escrevendo, você diminui essa velocidade, e isso cria a pausa necessária para mudar a forma de pensar.
A sra. fala no livro sobre a “interseção entre a ciência e a sabedoria da minha avó”. Um dos principais ensinamentos citados de dona Maria Helena é a ideia de ser água e ser pedra. Qual a relação entre ser água e viver com ousadia?
Marques: Viver com ousadia, no final do dia, é criar flexibilidade no cérebro para poder se adaptar às condições que o mundo traz. Minha avó me ensinou isso com a ideia de que há dois tipos de pessoas: as que, diante de mudanças ou dificuldades, viram uma pedra. Elas ficam rígidas e têm sempre a mesma forma de agir. Já a água não tem o poder da pedra, mas ela consegue transformar a pedra. Viver com ousadia é viver uma vida em que o obstáculo acontece, mas você se molda para continuar rumo ao seu norte. E é aí que os valores pessoais são importantes, porque se a ideia é construir uma vida melhor, você precisa saber para onde quer construir essa vida. As três habilidades criam flexibilidade cognitiva, e com isso você consegue ser a água para lidar com os obstáculos, porque eles virão. Isso mudou minha vida, e é o que eu ensino às pessoas hoje.
Quem é Luana Marques
A história pessoal da Dra. Luana de superação de adversidades, trauma e pobreza enquanto crescia no Brasil fornece autenticidade e profundidade à sua mensagem.
Hoje, como Professora Associada na Harvard Medical School, Ex-Presidente da Associação Americana de Ansiedade e Depressão, e autora de best-sellers, ela é um paradigma de resiliência, determinação e audácia.
É autora do livro “The Bold Move”: método experimentado e testado para tirar você da rotina e lhe dar coragem para criar uma vida mais confiante e significativa. Dr. Luana aponta a ansiedade que está na raiz da evitação e mostra como superá-la e atingir seus objetivos.
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Conteúdo e Informações: Valor Econômico.